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domingo, 15 de maio de 2011

O DIA DA FUGA

O DIA DA FUGA



Minha história inicia-se nos anos de 1943 no sétimo Distrito de Vacarias Muitos Capões, hoje município, no Estado do Rio Grande do Sul. Cresci livre correndo entre os verdes campos, nadando nos límpidos riachos e se alimentando com paçoca de charque de carne de gado, galinha e de frutas e legumes fresquinhos colhidos na horta e nos pomares que havia em todas as propriedades rurais, a minha infância foi de intensa felicidade, pois não conhecia o mal nem a malícia e a perversidade que assediam as crianças de hoje. Cresci ouvindo a voz do Brasil o Rodeio Farroupilha e ouvindo falar de Getulio Vargas e das grandes revoluções e guerras, guerra dos Farrapos, Guerra do Contestado, 1º e 2º Guerra Mundial, Guerra Fria, Guerra do Golfo e a Guerra do Vietnã. Papai nos explicou que houve uma época que era proibida falar mal do governo e só havia dois partidos o PTB que era dos pobres e o PSD que era do governo e dos patrões papai era do partido do PTB mas a gente não podia dizer isso na escola, nos dias de eleições no Ginásio. Nas ruas a gente via o medo estampado no rosto das pessoas e os eleitores não ousavam nem cochichar, pois era vigiado o tempo todo e ao final das eleições que foram regulamentadas pelo AI 15- este ato institucional impôs a data das eleições nos municípios para 15 de novembro de 1970. -quem vencia era sempre o candidato do governo.
Com apenas 14 anos de idade eu já acalentava grandes sonhos, tinha dois grandes sonhos: queria ser padre ou médico. Não sei de onde veio esta vocação, pois não havia em minha família padre ou médico. Às vezes eu sonhava que era padre e médico ao mesmo tempo. Quando acordava via que tudo não passava de um sonho. Um dia eu falei para minha mãe de minha vocação e ela me disse então: Meu filho para ser médico você precisa trabalhar em um hospital e ser padre, tem se coroinha ajudar o padre a resar missa meu filho?. Ela achava, assim como eu, que para ser um médico bastava trabalhar em um hospital. Na cidade onde eu morava havia dois hospitais. Fui procurar emprego, mas não consegui. Resolvi procurar em uma farmácia, porque também achava que trabalhando em uma farmácia eu poderia tomar-me um médico. E foi numa farmácia em Lagoa Vermelha no Rio Grande do Sul, que eu trabalhei dois anos com manipulação de remédios. Isto foi lá pelo ano de 1957.
Eu e meus pais éramos amigos de uma família vizinha nossa. Certo dia ouviu uma conversa que esta família ia mudar-se para Francisco Beltrão, uma pequena cidade longe uns 800 km de onde morávamos, e que lá estava sendo construído um hospital. Aí me ocorreu a idéia de ir com os nossos vizinhos para Beltrão, para poder estudar para médico no hospital que estava sendo construído naquela cidade. Fui até meus pais e pedi que me deixassem ir com a família vizinha ao Paraná. E claro que a resposta foi negativa, mas eu não desisti da idéia. Procurei saber a data da partida deles e me preparei para fugir. Pensava em me esconder na mudança, pois era o único jeito de eu ir com eles. No dia da viagem, arrumei minha pequena mala, e sem ser visto me escondi na mudança e o caminhão partiu. Depois de um dia de viagem o motorista percebeu algo estranho que se movimentava na carga, indo verificar, acabou por me descobrir. Eu fiquei sem jeito e a família muito preocupada sem saber o que fazer comigo, pois já estávamos muito longe e não havia meio de avisar meus pais. A única maneira era continuar a viagem. Depois de 10 dias chegamos em Francisco Beltrão. Deixaram-me lá e seguiram viagem, até hoje não sei para onde. E lá estava eu, às duas horas da tarde de um dia qualquer de 1958, em Francisco Beltrão, com fome e sem saber o que fazer. Resolvi procurar um hotel, onde pudesse comer. Sentei num banco em frente ao hotel, fazia frenye com o hospital do Dr. Valter era um hotel de madeiramuito humilde porem com muita freguesia. Enquanto admirava a quela cidade fantasma, pois há poucos anos atraz tinha acontecido a revolta dos colonos havia muitas casas queimadas e destruídas. E nesse instante cruzou por mim um homem magro com vários sacos nas costas, cheios de latas, a me ver perguntou se eu não queria ir com ele ajudá-lo a pintar um hospital e eu mais que depressa respondi que não sabia pintar, não me toquei estava desesperado, com fome e muito medo eu trimia, me senti abandonado e perdido no mundo, pensava eu que Francisco Beltrão fica ali pertinho se eu quesece podia voltar até mesmo apé. Ele virou-se o pintor e continuou seu caminho. Eu pensei? Se eu for trabalhar com aquele homem pintor, depois de terminada a pintura eu poderia ficar trabalhando no hospital e me tomar médico. Corri atrás do pintor que já tinha se distanciado umas duas quadras e aos gritos pedia que parasse, prontamente aquele homem parou e atentamente escutou o meu pedido que aceitaria trabalhar com ele. Ele, então me ordenou que eu fosse até o hotel onde eu me encontrava sentado e trouxesse umas latas de tinta que se encontravam lá nos fundo daquela casa de hospedagem, com algumas dificuldades encontrei a latas e tão rápido nas costas corri para alcançá-lo. Ao chegarmos ao local onde seria feita a pintura, percebi que era um velho hotel próximo o armazém do Osmar Brito ali ia ser transformado em um hospital. Perguntei ao velho pintor, cujo apelido era Kubicheque, como era o nome do dono do hospital e ele me disse que era o médico Dr. Kit Abdala. Médico do hospital Santo Antonio. Naquele mesmo dia, começamos a pintura do velho hotel. Mas como o pintor era alcoólatra, trabalhava quase bêbado e o doutor Kit Abdala não gostou do trabalho dele e acabou por dispensá-lo. Dos meus 14 anos, cheio de esperaça e ilusões característico de um jovem inexperiente e mal orientado pelos pais e amigos, não por maldades, mas por falta de conhecimentos como lidar com jovens, na época era normal, os meios culturais eram distantes e poucas pessoas tinham acesso á educação e estes poucos se valiam do seu poder aquisitivo para manter atualizados os seus conhecimentos que as universidades ofereciam, estaladas nos grandes centros de capitais. Uma das ocorrências que surgiu em nossas atividades se assim posso classificar, ocorreu no primeiro dia de trabalho com a pintura no hospital. “De tão dramática a situação que envolveu a dita pintura do velho casarão, onde funcionava um hotel e cujo estabelecimento ia se transformar em um hospital” Não desista caro leitor o pior esta para acontecer”.
A história começa assim; O hospital era de três andares o pintor, meu patrão, depois várias tentativas por onde começa a pintura resolveu começar pelas soleiras do prédio, não havia escada que alcançasse o local onde ia ser feita a pintura. O pintor construiu um andaime, como o referido não era suficiente para alcançar a soleira, ele colocou uma escada encima dos andaimes para atingir o local da pintura. Esta tarefa de pintar a soleira coube a mim, diante dos fatos o risco era bem menor de sofrer um acidente, devido a altura e a má construção dos andaimes. Para dar mais segurança, o meu patrão cujo pintor, amarrou-me uma corda na cintura e prendeu na perna de uma cama pelo lado de dentro do prédio, e o pintor depois de ter me alcançado a lata de tinta e uma brocha, na época não existia rolo de pintar, o pintor saiu e foi tomar uma pinga num boteco na frente da casa do colono perto do hotel onde estávamos pintando, do alto do andaime eu observava o dito pintor saboriar a caninha marca tatu. Confesso que até demorei em dar início na pintura, as minhas pernas tremiam, as rajadas de vento que não era tanto, mas diante da situação e da altura qualquer obstáculo era motivo de medo. À medida que eu me movimentava para pintar, a corda cedia, em um determinado momento percebi que não podia alcançar a ripa do degrau da escada, percebi que olhando pela vidraça do quarto onde a corda estava amarrada no pé da cama, aquele objeto de descanso não era pesado o suficiente para suportar o peso do meu corpo, mal calculado pelo meu patrão, reconhece que eu era magricela, mas não tanto para comparar com uma cama marca patente e assima de tudo sem os forros que poderia se houvesse dar mais peso. Após uma hora, fui socorrido pelo médico Dr. Kit Abdala que chegou ao momento que o Kubicheque se aproximou da corda para desamarrar, com certeza a minha queda era fatal, pois eu já estava somente com as pontas dos pés no degrau da escada sem apoio o espaço não permitia que eu alcançasse a escada. No mesmo dia quando pintávamos uma parede o Dr. Kit atropelou o pinguço, e mandou ele se internar em clinica para um tratamento de alcoolismo.
Então o pintor convidou-me para irmos pintar uma usina na seção Jacaré. Peguei a mochila do pintor e como estávamos no terceiro andar, fui descendo as escadarias, quando encontrei o Dr. Kit que ia subindo, parei por um instante com vontade de pedir um emprego a ele, mas faltou-me coragem, Continuei descendo pelas escadas abaixo, quando ouvi o uma voz do médico, perguntando-me se eu queria trabalhar com ele. Fiquei arrepiado de emoção, pois era tudo o que eu queria. O médico perguntou-me quanto eu ganhava como pintor e eu falei que trabalhava de graça para ele, pois eu queria aprender para ser médico. O médico vendo minha inocência, falou-me que eu teria que trabalhar por um ano em serviços gerais, pois havia muitas coisas a serem organizadas, para transformar aquele velho hotel em um belo hospital. Nesse instante eu pensei que estava começando a realizar o meu grande sonho de ser médico.
Eu dezempenhava os serviços mais sujo que havia no hospital, lidando com porcos e galinhas as vezes eu não conseguia comer, parecia que a comida era esterco de galinha ou de porcos. Depois de uns dois meses longe de casa foi que eu consegui dar notícias minhas aos meus pais que já estavam desesperados. Imaginavam que eu tinha ido embora para o Paraná com os vizinhos, mas não tinham certeza.
Depois de uns três meses, o hospital começou a funcionar e internar doentes e foi aí que aconteceu um fato interessante. Uma senhora foi operada lá no hospital e como não tinha dinheiro para pagar as despesas hospitalares, deixou uma filha de 11 anos como garantia até poder pagar o restante do tratamento. Confesso que fiquei com muita pena dessa menina. Ela era bonitinha e muito trabalhadeira. Ficamos amigos, e às vezes chorávamos a saudade que sentíamos de nossos pais. Eu levava remédio para ela quando ela ficava doente e também lhe comprava uns docinhos para conforta-¬la. Mais do que ninguém, eu sabia como era duro ficar longe dos pais. Eu estava com 14 anos e ela com 11.
Tornamo-nos grandes amigos. Amizade esta que mais tarde se consolidou em um grande amor.
O tempo foi passando, até que um dia os pais de Zelinda vieram para pagar a dívida deles no hospital e lavá-la embora. Mas o médico não deixou que a Zelinda fosse embora, pois ela havia conquistado o coração do médico assim como o meu. Ele falou para o pai dela, o Sr. Luiz, que queria fazer dela uma grande enfermeira. Seu Luiz concordou e ela ficou. Eu havia feito a maior torcida porque éramos muito amigos, quase irmãos.
O tempo foi passando, eu e a Zelinda cada vez mais firmes na enfermagem. Depois de uns três anos já éramos bons enfermeiros e continuávamos grandes amigos. Ela tomou-se uma mocinha muito bonita e uma excelente auxiliar de cirurgia, e eu às vezes fazia anestesia, às vezes instrumentava as cirurgias. Infelizmente chegou o dia de nos separarmos.
Fui chamado para o exército, e tive que deixar lá a Zelinda e meu sonho de ser médico. Já havia me dado conta que para ser um médico, não bastava eu trabalhar em um hospital, mas sim estudar. E muito. E para isso havia que se ter condições que eu não tinha. Lembro muito bem de que no dia em que eu parti para me preparar para servir o exército, nós nos Abraçamos e choramos muito.















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