O NASCIMENTO DE UMA PRINCESA
Quando eu a Zelinda casamos, nosso sonho era ter um filho. Tentamos por dois anos, mas não conseguíamos. Fomos consultar um médico que nos disse que o útero da Zelinda era infantil, esta foi a explicação que nos foi dada. Pode ser que hoje exista outra situação, pois com a evolução tão grande da medicina, tudo está sendo mais bem escla¬recido. Pois lá se vão trinta e três anos. Depois de uma série de tratamentos a minha esposa engravidou. Foi um dia de muita alegria para nós ao sabermos da gravidez.
Nós tínhamos uma pequena farmácia num bairro em Francisco Beltrão. Devido a circunstâncias legais e financeiras tivemos que fechar a farmácia, ficando com algumas dívidas. Nessas alturas a gravidez de minha esposa já estava no sétimo mês. No tempo em que tínhamos a farmácia tivemos grandes amigos, mas sempre existe algum que se destaca mais. Foi o caso de um casal que veio transferido havia pouco tempo, de Curitiba e ao qual procuramos dar muito apoio, pois não conheciam ninguém na cidade. Ele era da Polícia Rodoviária e ela de um departamento de assistência social do estado. Foi a melhor coisa que fizemos, pois eram duas pessoas maravilhosas. Queríamos levá-los para batizar nossa filha que estava para nascer. Mas isso não foi possível porque eles voltaram a Curitiba antes do nascimento do bebê. Ficamos muito tristes com a partida deles. A nossa amizade era muito grande. O tempo foi passando e aguardávamos com ansiedade o nascimento daquela filha, e estávamos felizes, apesar da situação financeira estar difícil.
Até que chegou o grande dia. A minha esposa estava sentindo fortes contrações, e eu a levei ao hospital do Dr. Kit. Como não tínhamos dinheiro para o táxi, fomos a pé. Para chegarmos ao hospital tínhamos que atravessar uma velha ponte e foi aí que a Zelinda quase teve a filha altas horas da noite. Depois de muito esforço, e sofrimento chegamos ao hospital onde fomos muito bem atendidos pelo Dr. Kit que não nos cobrou nada, pois ele e sua querida e saudosa esposa, a D. Marli foi como nossos segundos pais e tudo o que somos hoje, devemos a eles.
Ao nascer a nossa filha, a qual demos o nome de Lara Tatiana, tivemos uma notícia triste. Ela havia nascido com os pés voltados para dentro. Zelinda esperava ansiosa pelo bebê e eu tinha que contar a ela como Lara havia nascido. Peguei-a nos braços e levei¬-a para minha esposa com o coração apertado com medo da reação dela. Mas ao ver o rostinho lindo que parecia uma boneca, ela não deu muita importância ao que lhe contei, o que ela queria mesmo era acariciar aquele lindo bebê que se transformou numa linda mulher.
Dr. Kit nos falou que quando Lara fizesse um ano, tínhamos que levá-la para Curitiba para resolver o problema dos pezinhos dela.
Tivemos que voltar para a casa de meus sogros em Alto Faradai onde eles tinham uma chácara muito bonita. Certo dia eu e a Zelinda procuramos um lugar onde pudéssemos conversar sem interferência de ninguém. E foi na sombra de um mamoeiro do qual saboreamos uma gostosa fruta que chegamos a decisão que eu tinha que ir atrás de um emprego. A única coisa que tínhamos era um radinho portátil, à pilha do qual eu teria que me desfazer para conseguir algum dinheiro. Depois de conversar com o meu sogro, parti com destino certo de Alto Faradai para São Valério, longe uns trinta e cinco quilômetros dali. Saí a pé, só com uma sacola e o rádio. Meu cunhado, Alfredo Davies foi junto, pois ia visitar uns parentes em São Valério.
Chegamos lá, cansados, com fome e sem dinheiro. Não foi nada fácil. Ali, eu e o meu cunhado nos separamos. Ele ia fazer as suas visitas e eu tinha que viajar para Francisco Beltrão e de lá para a Secção do Jacaré uma região povoada por italianos gaúchos, a uns 10 Klms. De Beltrão, onde nós tíamos muitos amigos que conquistamos quando trabalhávamos com o Dr. Kit Abdala. Chegando lá fui procurar o meu amigo José Antonio Wereig esposo da Sra. Jandira Nesi Wereig, parente do grande empresário Sr. Olívio Cidadin proprietário do ponto a Ponto. Lá eu procurei os meus amigos que eram da família Nesi e família Cidadin e foi com eles que eu arrumei dinheiro para montar uma pequena farmácia no vilarejo.
Depois de Ter instalado a farmácia e arrumado uma casa para morarmos, fui buscar minha esposa e nossa filha para o nosso novo lar e nosso comércio, de onde pretendíamos conseguir o dinheiro para o tratamento da nossa filha.
Depois de um ano de muito trabalho, eu na farmácia, a Zelinda atendendo partos, e para aumentarmos nossa renda, montamos uma estofaria no porão da casa onde fazíamos camas e sofás que muitas vezes eram trocados por gado e porcos dos quais fazíamos salame para vender no comércio, fizemos um balanço do que tínhamos ganhado e com todas as contas pagas, a casa mobiliada, ainda tínhamos seis milhões de estoque na farmácia, quantia que eu não sei o quanto valeria atualmente pois já se passaram muitos anos. Resolvemos então que com o que tínhamos dava para fazer o tratamento que Lara precisava.
Estávamos cientes da dura batalha que nos esperava, pois tínhamos que pagar tudo o tratamento levaria uns nove meses. Lara teria também que usar botas mecânicas e pelo o que nos disse um médico lá em Curitiba, iríamos gastar em tomo de quatro milhões. Com o que tínhamos dava para arriscar.
Começamos então o tratamento. Nos primeiros meses ia eu e a Zelinda para Curitiba, mas como cada vez que íamos tínhamos que ficar por lá uns sete dias e os gastos com passagens, pensões, comida e o tratamento se tomou demais para nós, decidimos nos dividir. Zelinda ficava atendendo a farmácia e eu ia com Lara para Curitiba. Com sete meses de tratamento Lara já havia passado por uma cirurgia e tinha que ficar engessada da cintura para baixo. Numa das viagens aconteceu um fato que eu nunca esqueci. Cheguei à rodoviária com Lara engessada, no meu colo e carregando uma sacola grande com as roupinhas dela e leite Ninho pra ela. Tinha que fazer o trajeto da rodoviária ao hospital que ficava a umas vinte quadras dali, à pé. Não havia dinheiro para o táxi, pois era tudo contadinho para as passagens, o hospital e a estadia. Era de manhã e estava muito frio, depois de trocar as fraldas da Lara e dar¬-lhe a mamadeira, comecei a andar em direção ao hospital. O frio era intenso e como percebi que Lara tremia de frio, tirei meu paletó e agasalhei, mas não adiantou, estava ficando roxa e estava passando mal. Cheguei numa lanchonete para esquentar a mamadeira para a Lara e pedi para a mulher que atendia a lanchonete, se ela sabia de algum lugar onde eu pudesse encontrar alguma coisa para aquecer minha filha, e ela falou-me que duas quadras antes da lanchonete havia um prédio velho com um porão onde funcionava uma assistência social. Voltei até lá, entrei e encontrei uma fila enorme de pessoas muito pobres. Desesperado entrei na fila desanimado com o tamanho, imaginando se a minha filha ia suportar até que fôssemos atendidos, eu tremia de frio e de desespero. Nisso senti um cutucão no braço. Era o guarda que cuidava da fila, que reparando na minha situação mandou que eu fosse á frente e sentasse num banco e me ordenou para que entrasse por uma das portas que havia ali assim que saísse quem estava sendo atendido. Esperei um pouco e assim que saiu alguém pela porta eu entrei e do outro lado da escrivaninha uma mulher falava espantada o meu nome e me perguntava o que eu estava fazendo ali. Eu, meio atordoado olhei melhor para ela e vi que era a nossa amiga que, havia morado em Beltrão. Ela socorreu depressa minha filha e depois conversamos e ela me deu o endereço do apartamento dela caso eu precisasse de alguma coisa.
O tempo foi passando e Deus tinha feito tudo dar certo. Quando vendi os últimos vidros de remédios da farmácia, Lara colocou a sua última bota mecânica e ficou com os pés perfeitos e tomou-se uma linda mulher. Tem três filhos maravilhosos e um marido muito trabalhador e peço que Deus os ilumine para que sejam felizes.
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