NO LIMITE DA VIDA
Na época em que eu comecei a trabalhar na Casa de Saúde do Dr. Kit Abdala, o acordo que firmei com ele foi de que eu trabalharia no hospital de graça durante um ano, a troco de cama, comida e da assistência médica que viesse a necessitar.
O meu trabalho seria cuidar do chiqueiro dos porcos, do galinheiro, conservar uma caixa d’água sempre cheia, bombeando água do poço, já que na época não havia água encanada e nem energia elétrica. Também era de minha responsabilidade pegar os pães da padaria todos os dias às 5 horas da manhã. Além disso, eu teria que rachar a lenha para o fogão do hospital e efetuar pequenos consertos que se fizessem necessários, pintar as paredes e os móveis, cortar a grama, conservar a horta do hospital e qualquer outra atividade que pudesse surgir.
O meu entusiasmo era tão grande em aprender enfermagem que eu não reclamava de nada, levantava às 5 horas da manhã e só deitava depois que tudo estivesse pronto, ou,,seja até a última tarefa do dia estar pronta, e esta tarefa era deixar a caixa d’água cheia. Isso era feito de noite, mil litros tirados através da manivelam levava geralmente umas 3 horas, além da lenha que deveria ficar empilhada atrás do fogão, que também era feito durante a noite, porque no dia não daria tempo, e era preciso que tudo estivesse pronto. Quando o hospital abrisse pela manhã.
Após uns 6 meses que eu estava afastado de meus pais, recebi a visita de meu irmão Orlando, que veio mandado por para saber como eu estava.
Ao chegar ao hospital por minha procura, ele foi recebido por um senhor muito idoso que estava internado no hospital há uns 3 meses. Este senhor tinha uma doença muito grave e o Dr. Kit Abdala prestava o atendimento médico sem cobrar. Isto sempre foi uma particularidade do médico; prestava esses atendimentos gratuitos em certos casos em que o paciente não podia pagar, mas realmente necessitava de atendimento.
Este senhor, ao conversar com meu irmão, recomendou que ele me levasse embora, falando que eu estava sofrendo muito ali, e que como ele estava internado há algum tempo, via meu sofrimento, e que aquilo era para ele, um crime.
Meu irmão depois de conversar bastante comigo contou-me o que aquele senhor lhe havia dito e eu mais do que depressa inventei uma desculpa mentirosa de que este senhor vendo o meu futuro estaria pleiteando colocar um neto seu em meu lugar, e por esta razão estaria querendo me tirar dali. Meu irmão acreditou na minha mentira e, após uns dois dias ele despediu-se e foi embora levando para meus pais boas impressões. As melhores que pude inventar.
Após algumas semanas ou meses, não sei bem o tempo em que decorreu, tinha apenas uma calça, uma camisa, um par de sapatos e um de meias.
Nessa época o Dr. Abdala contratou um trator para fazer uma terraplanagem, no terreno do hospital, e eu tinha como incumbência ajudar o tratorista no que fosse preciso, então como eu tinha só um par de sapatos e um de meias eu tirei dos pés e coloquei em uma sombra para não estragar. Após umas 2 horas de trabalho da máquina já havia um grande volume de terra por toda a parte. Foi nesse momento que eu me eu me lembrei do meu sapato e ao olhar na direção em que havia deixado-o, vi somente um monte de terra, corri naquela direção e percebi que o meu único par de sapatos estava sob aquele imenso aterro, e confesso que chorei. Como é que eu ia fazer sem calçado? Eu não tinha o hábito de andar descalço, mas o jeito foi começar a me acostumar com a idéia de andar sem proteção nos pés, já que pedir calçado para alguém não me passou pela minha cabeça, pois eu sempre tive esta mania que conservo até hoje de não ser pedinchão, não por orgulho, e sim por não chatear as pessoas, pois sempre tive para mim que tudo o que a gente adquire é sempre mais gostoso dizer que foi com o nosso trabalho honrado que se conquistou.
Após uma semana o serviço de terraplanagem terminou, e meus pés estavam muito feridos, até com algumas inflamações, mas eu à noite lavava-os com água e sabão para retirar tudo que pudesse piorar seu estado e ao amanhecer do dia tinha a responsabilidade de ir a padaria buscar 4 sacos de pães. Naquele tempo eu tinha uma grande satisfação de que isso acontecesse de madrugada e que ninguém me visse na rua de pés descalços.
Quando acabou o serviço de terraplanagem foi me dada a ordem pelo gerente do hospital, o Sr. Isaias Barbosa, de que eu teria que limpar um grande galinheiro, onde havia umas cem galinhas que não poderiam ser retiradas durante a limpeza. Eu lá dentro a as galinhas se empoleirando em mim, de quando em vez, me “cuspindo” do alto.
Ao chegar perto do meio dia eu estava coberto de titica de galinha, o meu cabelo estava grudando, e muitas vezes tive ânsias de vômito só de pensar em almoçar. O jeito era mesmo terminar o trabalho primeiro, mas para isso eu precisaria ir até à tarde.
A crosta de fezes envolvia o assoalho uns 5 centímetros.
Quando terminei o trabalho, pedi a lavadeira do hospital que me fizesse um favor: lavar as minhas roupas enquanto eu esperava nu dentro de uma pipa. E ela teria que lavar e secar a roupa o mais depressa possível porque o lugar era meio incômodo. Não dava para ficar muito tempo, sei que parece ficção, mas Deus é testemunha de que estou falando a verdade.
Depois que eu estava novamente vestido, ofereci a lavadeira uma mala que era uma das poucas coisas que eu tinha, porque se ela pudesse me comprar a mala eu poderia comprar um par de sapatos - uma Conga. Ela ficou com a mala; pude novamente calçar meus pés e até hoje acredito que ela não queria realmente comprar aquela mala.
O Sr. Isaias tomou conhecimento da minha situação através da lavadeira e levou o caso até a dona Marli Abdala, esposa do Dr. Kit e essa senhora por sua vez foi até o comércio para me comprar uma calça de brim-coringa e uma camisa. Eu fiquei tão emocionado que até chorei.
Embora eu nunca antes tivesse sido um chorão ultimamente andava muito sensível, principalmente quando recebia cartas de meus pais, demorava a lê-Ias de tanto chorar em sua leitura. Nunca antes tinha dado tanto valor a eles como naqueles meses em que eu estava fora de sua casa. Lembrava de muitas coisas que eram simples, mas que faziam muita falta agora que eu estava distante. Quantas vezes minha mãe, à noite vinha ver como eu estava, colocava mão em minha testa para ver se eu não estava com febre, agitava a coberta e, às vezes me dava um beijo na testa, fazendo isto também com todos os meus irmãos. O café da manhã sempre prontinho, a roupa limpa e a pasta arrumada para ir à escola, e palavras carinhosas nos abençoando. Caminho certo para darmos o real valor a nossos pais é passar pelo que eu passei, como eu passei. A dona Marli, quando me entregou as roupas foi áspera comigo dizendo que eu era muito orgulhoso e se eu não tinha boca para falar, deixando que a situação chegasse neste estado de miséria em que parecia escravidão. Comentando como, se seu marido ficasse sabendo, me daria bons puxões de orelha. Eu tentei explicar, mas não deu. As palavras não saiam pela emoção. O que eu queria dizer e não pude é que o trato com o doutor era de que eu trabalharia um ano sem salário, pela cama e comida, e que por isso não tinha o direito de exigir mais. E que quando se passasse o ano eu passaria a trabalhar na enfermagem e então teria salário. Desse mesmo dia em diante eu passei a ter um salário por mês, graças à interferência de meus colegas que levaram o caso até a dona Marli.
Após um ano de serviços externos, o Dr. Abdala ordenou à enfermeira Marika Oliboni que começasse a me ensinar enfermagem. E já se passaram 40 anos, sendo que eu continuo dentro da área da saúde, um pouco curativa, outra pouco preventiva, mas na área.
Não existem obstáculos que interrompam o caminho de alguém, quando este alguém tem um objetivo.
Na época em que eu comecei a trabalhar na Casa de Saúde do Dr. Kit Abdala, o acordo que firmei com ele foi de que eu trabalharia no hospital de graça durante um ano, a troco de cama, comida e da assistência médica que viesse a necessitar.
O meu trabalho seria cuidar do chiqueiro dos porcos, do galinheiro, conservar uma caixa d’água sempre cheia, bombeando água do poço, já que na época não havia água encanada e nem energia elétrica. Também era de minha responsabilidade pegar os pães da padaria todos os dias às 5 horas da manhã. Além disso, eu teria que rachar a lenha para o fogão do hospital e efetuar pequenos consertos que se fizessem necessários, pintar as paredes e os móveis, cortar a grama, conservar a horta do hospital e qualquer outra atividade que pudesse surgir.
O meu entusiasmo era tão grande em aprender enfermagem que eu não reclamava de nada, levantava às 5 horas da manhã e só deitava depois que tudo estivesse pronto, ou,,seja até a última tarefa do dia estar pronta, e esta tarefa era deixar a caixa d’água cheia. Isso era feito de noite, mil litros tirados através da manivelam levava geralmente umas 3 horas, além da lenha que deveria ficar empilhada atrás do fogão, que também era feito durante a noite, porque no dia não daria tempo, e era preciso que tudo estivesse pronto. Quando o hospital abrisse pela manhã.
Após uns 6 meses que eu estava afastado de meus pais, recebi a visita de meu irmão Orlando, que veio mandado por para saber como eu estava.
Ao chegar ao hospital por minha procura, ele foi recebido por um senhor muito idoso que estava internado no hospital há uns 3 meses. Este senhor tinha uma doença muito grave e o Dr. Kit Abdala prestava o atendimento médico sem cobrar. Isto sempre foi uma particularidade do médico; prestava esses atendimentos gratuitos em certos casos em que o paciente não podia pagar, mas realmente necessitava de atendimento.
Este senhor, ao conversar com meu irmão, recomendou que ele me levasse embora, falando que eu estava sofrendo muito ali, e que como ele estava internado há algum tempo, via meu sofrimento, e que aquilo era para ele, um crime.
Meu irmão depois de conversar bastante comigo contou-me o que aquele senhor lhe havia dito e eu mais do que depressa inventei uma desculpa mentirosa de que este senhor vendo o meu futuro estaria pleiteando colocar um neto seu em meu lugar, e por esta razão estaria querendo me tirar dali. Meu irmão acreditou na minha mentira e, após uns dois dias ele despediu-se e foi embora levando para meus pais boas impressões. As melhores que pude inventar.
Após algumas semanas ou meses, não sei bem o tempo em que decorreu, tinha apenas uma calça, uma camisa, um par de sapatos e um de meias.
Nessa época o Dr. Abdala contratou um trator para fazer uma terraplanagem, no terreno do hospital, e eu tinha como incumbência ajudar o tratorista no que fosse preciso, então como eu tinha só um par de sapatos e um de meias eu tirei dos pés e coloquei em uma sombra para não estragar. Após umas 2 horas de trabalho da máquina já havia um grande volume de terra por toda a parte. Foi nesse momento que eu me eu me lembrei do meu sapato e ao olhar na direção em que havia deixado-o, vi somente um monte de terra, corri naquela direção e percebi que o meu único par de sapatos estava sob aquele imenso aterro, e confesso que chorei. Como é que eu ia fazer sem calçado? Eu não tinha o hábito de andar descalço, mas o jeito foi começar a me acostumar com a idéia de andar sem proteção nos pés, já que pedir calçado para alguém não me passou pela minha cabeça, pois eu sempre tive esta mania que conservo até hoje de não ser pedinchão, não por orgulho, e sim por não chatear as pessoas, pois sempre tive para mim que tudo o que a gente adquire é sempre mais gostoso dizer que foi com o nosso trabalho honrado que se conquistou.
Após uma semana o serviço de terraplanagem terminou, e meus pés estavam muito feridos, até com algumas inflamações, mas eu à noite lavava-os com água e sabão para retirar tudo que pudesse piorar seu estado e ao amanhecer do dia tinha a responsabilidade de ir a padaria buscar 4 sacos de pães. Naquele tempo eu tinha uma grande satisfação de que isso acontecesse de madrugada e que ninguém me visse na rua de pés descalços.
Quando acabou o serviço de terraplanagem foi me dada a ordem pelo gerente do hospital, o Sr. Isaias Barbosa, de que eu teria que limpar um grande galinheiro, onde havia umas cem galinhas que não poderiam ser retiradas durante a limpeza. Eu lá dentro a as galinhas se empoleirando em mim, de quando em vez, me “cuspindo” do alto.
Ao chegar perto do meio dia eu estava coberto de titica de galinha, o meu cabelo estava grudando, e muitas vezes tive ânsias de vômito só de pensar em almoçar. O jeito era mesmo terminar o trabalho primeiro, mas para isso eu precisaria ir até à tarde.
A crosta de fezes envolvia o assoalho uns 5 centímetros.
Quando terminei o trabalho, pedi a lavadeira do hospital que me fizesse um favor: lavar as minhas roupas enquanto eu esperava nu dentro de uma pipa. E ela teria que lavar e secar a roupa o mais depressa possível porque o lugar era meio incômodo. Não dava para ficar muito tempo, sei que parece ficção, mas Deus é testemunha de que estou falando a verdade.
Depois que eu estava novamente vestido, ofereci a lavadeira uma mala que era uma das poucas coisas que eu tinha, porque se ela pudesse me comprar a mala eu poderia comprar um par de sapatos - uma Conga. Ela ficou com a mala; pude novamente calçar meus pés e até hoje acredito que ela não queria realmente comprar aquela mala.
O Sr. Isaias tomou conhecimento da minha situação através da lavadeira e levou o caso até a dona Marli Abdala, esposa do Dr. Kit e essa senhora por sua vez foi até o comércio para me comprar uma calça de brim-coringa e uma camisa. Eu fiquei tão emocionado que até chorei.
Embora eu nunca antes tivesse sido um chorão ultimamente andava muito sensível, principalmente quando recebia cartas de meus pais, demorava a lê-Ias de tanto chorar em sua leitura. Nunca antes tinha dado tanto valor a eles como naqueles meses em que eu estava fora de sua casa. Lembrava de muitas coisas que eram simples, mas que faziam muita falta agora que eu estava distante. Quantas vezes minha mãe, à noite vinha ver como eu estava, colocava mão em minha testa para ver se eu não estava com febre, agitava a coberta e, às vezes me dava um beijo na testa, fazendo isto também com todos os meus irmãos. O café da manhã sempre prontinho, a roupa limpa e a pasta arrumada para ir à escola, e palavras carinhosas nos abençoando. Caminho certo para darmos o real valor a nossos pais é passar pelo que eu passei, como eu passei. A dona Marli, quando me entregou as roupas foi áspera comigo dizendo que eu era muito orgulhoso e se eu não tinha boca para falar, deixando que a situação chegasse neste estado de miséria em que parecia escravidão. Comentando como, se seu marido ficasse sabendo, me daria bons puxões de orelha. Eu tentei explicar, mas não deu. As palavras não saiam pela emoção. O que eu queria dizer e não pude é que o trato com o doutor era de que eu trabalharia um ano sem salário, pela cama e comida, e que por isso não tinha o direito de exigir mais. E que quando se passasse o ano eu passaria a trabalhar na enfermagem e então teria salário. Desse mesmo dia em diante eu passei a ter um salário por mês, graças à interferência de meus colegas que levaram o caso até a dona Marli.
Após um ano de serviços externos, o Dr. Abdala ordenou à enfermeira Marika Oliboni que começasse a me ensinar enfermagem. E já se passaram 40 anos, sendo que eu continuo dentro da área da saúde, um pouco curativa, outra pouco preventiva, mas na área.
Não existem obstáculos que interrompam o caminho de alguém, quando este alguém tem um objetivo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário